domingo, 22 de fevereiro de 2015

Afrodisíaco

























Título: Self Portrait
Fotógrafo: Audrey Periot
Colecção: Flickr

Paixão, amor? 
Obrigado, mas não! 
Prefiro guardar na boca 
o sabor dessa saudade, 
sem me prender, 
sem me perder, 
sem esquecer-me 
de mim
em primeiro lugar. 
Só assim sei,
que para sempre
vou-te amar, 
sem nunca 
me cansar
de ti.


terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Do saber empírico













Mercuro B Cotto

Quem dera
que o meu horizonte
fosse vasto até perder de vista,
um acento imenso
para além do conhecimento 
e da sabedoria.
Mas o ser do meu saber 
não é viajado
nem é rato de livraria,
é um escrito cego 
dos caprichos da vida,
alma a retalho de bagagem limitada
à mão intuitiva do coração.
Agora tem dias que o meu chão
tem a vontade das asas
de um pássaro.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Onda




















Kasia Derwinska

Quem me dera ter uma onda só para mim...
Mas não tenho mão suficiente para a agarrar,
só coração bastante para a amar.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Enredos de Palco























Francesca Woodman

Não te agastes meu querido,
tudo aquilo foram meras manobras de diversão
que nos desviaram o ser
e a nossa essência de rectidão.
Foi na dança de marfim,
entre véus
e marionetas,
que o jogo de conquista
se perdeu a favor das peças espertas.
Nada nos enganou, nada nos feriu,
nada nos tolheu o discernimento e a razão
com iras desmedidas,
tamanhas foram as histórias,
as mentiras,
e as sedes loucas e famintas
que ficaram por beber.
E neste eterno perder
sente-se falta de ter à mão
o tempo que foi
antes do dia amanhecer.
Neste rigor quero-te,
mas não assim,
nesta parca existência de mim,
da qual me resto rasto do perfume do jasmim
que tens plantado no teu jardim.
Hoje demito-me do estrelato
deste enredo de palco,
e saio de olhar acima do meu nariz empinado,
dando como encerrado o primeiro capitulo do nosso livro
que ainda não se fez prova de escrito vivo.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Noite Sonhada

Sandra Louçano
Restaurante D. Tonho, Porto

A eternidade da espera, para estarmos juntos uma noite inteira, foi tão severa que sem mais delongas, despidos de todos os formalismos, entramos no primeiro recanto escondido que encontramos para jantar.
O restaurante de gastronomia típica regional oferecia uma decoração rústica e aconchegante, mesmo ao nosso gosto.
O teu bife de lombo ao molho de manga com batata a murro enrolada em prata, a minha espetada de lulas e gambas ao alho, e mais uns quantos vegetais salteados, foram entremeados entre vinho, palavras, olhares e sorrisos tímidos, como se fossemos dois perfeitos estranhos durante a primeira descoberta. A sala cheia acolhia os amantes num murmurinho de conversas mudas e ouvidos cegos aos olhos alheios.
Do lado de fora, a noite de Porto à sexta é palco eufórico onde os corpos extravasam de mais uma semana louca do trabalho. Prolongamos o prazer da conversa e saímos tarde. Não estava frio, mas para os lados da Ribeira o nevoeiro denso era quase certo;
- Um café?
- Sim, à beira rio, disse eu!
No Porto a neblina, do outro lado levanta-se o véu sobre o rio de mão dada com a maré.
Tomaste de imediato o café, gostas dele bem quente. Eu saboreei-o primeiro ao leve encosto de lábios e deixei-o arrefecer lentamente enquanto o bebericava de olhos postos na imagem do velho casario de granito, casado com o rio e de braço estendedido até ao mar.
A viagem de regresso não permitiu visualizar a amplitude daquela paisagem, mas a cegueira do momento guardou a contemplação de uma noite sonhada, enquanto a música de fundo trauteava alegria entre olhares que estenderam cumplicidades até de manhã.
Apesar do nevoeiro e do espelho negro, tudo à nossa volta estava muito claro aquela hora.